Os tempos mais gloriosos terão sido enquanto estava na GDP, o meu primeiro trabalho, que coincidiu com a criação de Soncent. Depois foi quando estava na Irlanda, isolada numa ilha em inglês, em que as pessoas eram muito simpáticas mas incrivelmente frias e eu, animal tropical, deixava-me afectar pelos dias cinzentos, pela falta de amigos.
Mas houve coisas boas: Costumava ir de boleia com a secretária da empresa, a Ber, para o trabalho. Depois de uns três meses de lá estar, veio o João, um novo jurista da empresa, um português um pouco mais novo do que eu, de cabelos lisos castanhos. Era muito picuinhas nas suas coisas: a maior preocupação dele era que arrumássemos a loiça que estivesse seca antes de lavarmos mais pratos, não fosse a loiça seca... molhar-se.
O João queria que eu avisasse para onde ia, sempre que saía de casa, para o caso de ser, sei lá, atropelada, raptada, assaltada ou morta. Eu opunha-me a esses avisos, pois pareciam-me simplesmente inúteis para além de contraproducentes.
O João queria que eu avisasse para onde ia, sempre que saía de casa, para o caso de ser, sei lá, atropelada, raptada, assaltada ou morta. Eu opunha-me a esses avisos, pois pareciam-me simplesmente inúteis para além de contraproducentes.
- Vai que te aviso que vou ao minimercado e estando lá, decido que afinal vou ao cinema? Tu, não sabendo que fui ao cinema, ficas cá ultrapreocupado enquanto que estou na boa... mais vale não saberes de nada.
O bom do João foi ele ter-me proposto, um dia, que fôssemos a pé para o trabalho. Fomos juntos somente nesse dia - os nossos horários não eram os mesmos. Mas nunca mais fui de carro. Essa meia hora que fazia a ir a pé para o trabalho tornou-se a minha melhor meia hora do dia, apenas comparável aos quarenta minutos que fazia para regressar.
Ia a assobiar o caminho todo. Pois é! Foi na Irlanda que consolidei um hábito antes bastante clandestino: assobiar na rua. Foi também aí, à distância, que juntei os contos todos para Eileenístico, com a mamã em São Vicente a querer corrigir o meu português e eu a dar luta, porque já nessa altura considerava que
- Eu não sirvo ao Português, o Português é que me serve a mim.
Em agosto, vim a Cabo Verde em serviço, lancei o livro, fiquei feliz e achei que já podia assobiar às descaradas.
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