Soncent

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quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

A ditadura da máquina fotográfica

Tenho-me dado conta desta perseguição, acho que ontem foi o cúmulo. Estava num evento profissional e havia um fotografo freelance. Tudo bem. Tirou chapas daqui, chapas em ângulo, chapas de cima, de lado, (de baixo, não sei).

Depois fomos almoçar e ai estava o tal senhor, a querer fotografar-nos enquanto metíamos uma mandioca frita na boca, enquanto mastigávamos um pedaço de bife duro, enquanto tentávamos limpar a boca sem tirar o baton. Estendi-lhe uma mão imperativa - faça favor, senhor, a comer não! - Que interesse é que uma foto dessas poder ter?

Há tempos foi num bar, enquanto um grupo tocava umas tamboradas e eu saltava, feita boa cidadã deste país. Mais um armado com uma máquina com uma objectiva pornográfica. Disse-lhe em bom crioulo: não quero que me fotografe! E ele, sem entender porquê. E eu, a dizer-lhe com palavras e testa contraída - porque não! Sei lá para onde vão essas fotos? Alguma vez as vou ver? Não vê que isto é o meu tempo livre, privado, meu?

Há outra ditadura: nas festas de família, nos encontros de amigos, em eventos quaisquer - já praticamente ninguém conversa ou convive ou dança, porque se fazem milhares de fotografias digitais, e a toda a hora nos interrompem para fazermos pose, para tirarmos uma foto com este ou com aquele, fotos essas que mais depressa aparecem no facebook que no nosso e-mail, ou, credo, num álbum de fotografias!

E depois, os parentes da máquina fotográfica, infernizando-nos lá onde não esperávamos: vamos a uma festa escondidos e no dia seguinte, aparecemos num jornal online ou página social; damos uma trocolança e alguém nos capta, com o telemóvel, a fazer figuras tristes pelo simples facto de serem testemunhadas; já imaginaram o horror que é saber que em todo o lado (e dentro das 4 paredes e quiçá, debaixo da cama) há uma objectiva pronta para captar e eternizar os nossos esgares, corpos, gestos, acompanhantes, os nossos restos?

E tu queres aparecer nesta chapa? Diz o que pensas.

3 comentários:

Anónimo disse...

Esta última parte não é original... e tem dó, menina. CV ainda não é dado a essas loucuras a que te referes. Eu, mais do que tu, ando de eventos e eventos, e nunca vi tamanho nonsense. Pés no chão, menina.

Eileen Almeida Barbosa disse...

Que simpático, que corajoso, que comentário meritório. Trata-me por tu mas esquece-se de assinar... Ainda bem então que não somos dados a essas loucuras.

Ivan Santos disse...

Também fiquei curioso por saber o destino das fotos do "freelancer"!!!
Que até aí...nada contra ao trabalho dos profissionais. Até pq, eu próprio adoro fotografar, mas acho que cada um, digo cada profissional freelancer deveria saber o "timing da click" (já que existe o "timing da piada")
Mas que é pertinente e embaraçador, lá isso é!!!