Anunciaram esta manhã a minha morte. Noticiaram-na os jornais de maior tiragem e os diários electrónicos. Nos cafés, não se falava noutra coisa. Que eu morrera. Tiveram a coragem de dizer que toda a nação estivera à espera deste dia desde há mais de quarenta anos. Outros, nacionalistas, afirmaram que foi uma grande perda para o socialismo. Mas não vi ninguém chorar como se chorou pelo Ayrton Senna ou pela Diana. Nenhuma comoção, apenas a malícia da notícia. Já a imprensa internacional foi ao ponto de dizer que era só uma questão de tempo, que toda a gente já sabia que eu estava morto e que a propaganda é que me fazia vivo.
Quem foi que morreu? Morri eu. Ou devia ter morrido. Mas na hora, deu-me medo, não quis. E morreu outro, matei um pobre coitado que queria ser enterrado com todas as honras e tornei-me num pobre coitado, só que vivo ainda. O Martín, que andou comigo na Universidade e que me conhece tão bem, que me conheceu desde sempre, escreveu num jornal que “Foi hoje noticiada a morte de alguém que pensou que nunca iria morrer.” Fez ainda uma série de considerações sobre mim, sobre a minha herança, sobre o que mudará agora. Pois eu digo: não mudará nada. Esperei tanto, fugi tanto à morte, que dei tempo a que o mundo se adaptasse a tudo, que as mudanças sejam tão rápidas que nem damos por elas. Não mudará nada, a não ser para mim, que vivia com luxos de estadista e agora sou um jardineiro, tenho uma mulher velha e cega a quem pago para se manter calada e, se o dinheiro não basta, matamos-lhe o filho que vive em Buenos Aires.
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