Soncent

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segunda-feira, 4 de dezembro de 2006

Silêncio

Depois de um grande espectáculo, de muitos aplausos e de a plateia se ter retirado, se terem retirado igualmente os artistas, cai um silêncio na sala, que só é quebrado pelos passos do empregado de limpeza, que surge por uma das portas laterais e vem recolher o lixo.

Depois de um dia de sol na praia, das algaraviadas das crianças, dos gritos das gaivotas, dos altos volumes dos aparelhos de estereofonia dos rapazes, das risadas nervosas das raparigas, dos avisos indolentes dos pais, dos reclames do moço dos sorvetes, de terem todos ido para casa e do sol se ter posto, é mais uma vez o silêncio que reina até à manhã seguinte.

Depois da agitação do mercado, dos regateios das senhoras, dos assobios dos rapazes, dos pregões das vendedoras do peixe e das hortaliças, dos buzinares dos condutores de camionetas, do enxotar das moscas e dos preços gritados, depois das senhoras da Câmara arrastarem a sujeira toda, o silêncio reina entre as barracas de lona, sobre a calçada suja do mercado do preto.

Depois do burburinho da rua principal, das buzinas do automóveis luxuosos, dos autocarros caindo de podre, dos aposentados que se informam dos resultados dos jogos e os discutem, das gargalhadas nos cafés, das rabugices do rapaz dos jornais, das malcriações dos engraxadores. Bem depois da hora de ponta da tarde. A cidade pára, e desde o Palácio ao Passo, só se ouve o silêncio.

Depois de a mãe ter limpado tudo, depois dos presentes desembrulhados, depois da última rapariga se retirar, da ultima música tocar, dos urras dos rapazes terminarem, bem como as correrias pelos corredores, depois de brincar ao “Trouxe as cartas” e ao “Casamento Inglês”, depois do cantar os parabéns e se ter cortado o bolo e comido os acepipes todos, o sono chega, e com ele, o silêncio.
Parece que é sempre o silêncio o último a tomar posse das coisas. E dos mortos.

3 comentários:

Anónimo disse...

Este teu "post" é d uma sensibilidade profunda e realmente conseguiu tocar essa minha alma insensível! Se calhar foi por estar a lê-lo d madrugada, rodeado apenas por...silêncio! ;) Bijin d sodad,
Turta

Eileen Almeida Barbosa disse...

Hey, Turta, ê sempre mut sab sabê que bo ta estód ta frequentá Soncent! Mut sab prop!

Anónimo disse...

...e há ainda outros "silêncios" nos quais mergulhamos enqt recordamos momentos únicos vividos.
Mm qd à nossa volta todo o mundo insiste em nos agredir com conversas vulgares e sem interesse.

Amei este post!!! supreendentemente, dei por mim a "sentir" cada um dos sons enqt lia o que escreveste