Soncent

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terça-feira, 6 de setembro de 2011

Uma vez num cafufo

Uma vez morei num cafufo. No Sal. Ganhava 30 contos e 16 iam para a renda do sítio, que se compunha de um grande quarto, que no fundo era uma cave, com uma janela lá em cima, de onde facilmente qualquer um me poderia espreitar da rua; de um quintalzinho coberto a telha de plástico, que funcionava bem como estufa mas deixava entrar a água da chuva; de uma casa de banho e de um corredor. No quintalzinho, montei uma cozinha, com uma mesa velha que iam deitar fora, uma persiana a fazer as vezes de banca de cozinha, onde assentei duas tinas – ou cubas para lavar loiça.
Estava cronicamente sem água: tinha garrafões de 5 litros cheios por toda a parte e se me dissessem enquanto no trabalho, que havia água, eu era capaz de saltar até casa para encher uns quantos litros. Comprei, para subsistir, um guarda-fatos no chinês, uma chávena grande onde comer cereais, um espelho de corpo inteiro.
Durante parte dos seis meses que passei aí, não tinha frigorífico: descobri o quão limitada fica uma pessoa sem frio: comprava leite em pó, iogurtes mortos, fruta, muito pouca de cada vez. Tinha um rádio e o meu portátil mas passei domingos deitada na cama a pensar que, se eu morresse aí, só dariam pela minha falta vários dias depois. A vila ficava completamente vazia nesses dias e isso era deprimente.
Aprendi, durante esses meses, a viver com pouco. Comia num restaurante onde pagava ao mês e tinha contas contadas, mas ainda dava para ir dançar de vez em quando e pagar o hiace até Santa Maria.

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